26 de março de 2015

Direitos humanos violados no Brasil e caso foi esquecido pela história

Quando se fala em massacre de comunidades você com certeza vai se lembrar de Canudos e/ou da Rocinha. Acontece que teve um outro momento que também faz parte das tragédias brasileiras, mas que ficou escondido por muitos anos do conhecimento popular. O Massacre do Caldeirão de Santa Cruz aconteceu na década de 30, no interior do Ceará e não existe um número certo de pessoas mortas, pois muitos corpos sequer foram encontrados. Os militares após a aniquilação esconderam centenas de corpos em valas cuja localização é um mistério até hoje.

A história já foi cenário para alguns livros e um filme, mas o exército do Brasil nega o acontecimento e não há registro oficial do ataque. Conheça um pouco mais sobre o acontecimento e como se deu o massacre do Caldeirão de Santa Cruz.


Padre Cícero cria a comunidade Caldeirão de Santa Cruz do Deserto em 1926

Beato José Lourenço, aquele que acolhia os oprimidos pelos latifundiários
Beato José Lourenço, aquele que acolhia os oprimidos pelos latifundiários
A história da comunidade começa na verdade um pouco antes de 1926 no sítio Baixa Dantas, Crato, no Ceará. Este lugar foi comprado por um romeiro da Paraíba chamado Robert Mateus e trabalhado em conjunto com José Lourenço. Tudo o que os romeiros de Padre Cícero produziam no sítio era dividido igualmente entre todos moradores. O excedente da produção era vendido para o mercado da cidade gastava-se com a melhoria do local.
A queda do Sítio Baixa Dantas começou quando Padre Cícero ganhou um boi de presente, em 1921. Por incomodar muito os latifundiários acolhendo os mais pobres, os romeiros foram acusados de adorar o boi como Deus e isso supostamente acontecia sob a orientação de José Lourenço. O mesmo foi preso, mas solto dias depois.
Depois de pressões e perseguição não precisou muito para que os romeiros começassem a se afastar e a comunidade declinar. Em 1926 o Sítio Baixa Dantas foi vendido e os romeiros mudaram-se para uma fazenda de Padre Cícero, a qual ele chamou de Caldeirão de Santa Cruz do Deserto. Com a seca que aconteceu em 1932, o número de pessoas do Caldeirão de Santa Cruz ultrapassou as duas mil pessoas, mas não se tem um registro exato de quantos moradores viveram por lá.
Como a comunidade crescia de forma acelerada mesmo após a morte de Padre Cícero, em 1934 começou a ser considerada como um paraíso para a parcela mais pobre da região. Agora sob o comando de José Lourenço, os beatos começaram a sofrer ameaças de invasão. Foi assim que o Caldeirão de Santa Cruz do Deserto começou a incomodar as autoridades da época.

O Massacre do Caldeirão de Santa Cruz do Deserto

Com o coronelismo em alta e o exemplo de Canudos ainda vivo na memória do povo, a comunidade era taxada como lugar de pessoas profanas e fanáticas religiosas. Havia diversas denúncias para o então governo de Getúlio Vargas e os jornais da época também contribuíram com supostas histórias de maus tratos, incentivo à feitiçaria e muito mais.
A comunidade de canudos teve uma história e fim muito parecidos com o caldeirão
A comunidade de canudos teve uma história e fim muito parecidos com o caldeirão.
Foi então que em 1936 a comunidade foi invadida com direito a fuzis e bombardeios aéreos. Os sobreviventes, junto com José Lourenço, fugiram para a Serra de Araripe. O Caldeirão de Santa Cruz do Deserto foi saqueado, queimado e a maioria da população morta. Os refugiados alocaram-se em uma região chamada Mata dos Cavalos e por lá tentaram reconstruir a comunidade.
Ainda vendo ameaça por parte dos sobreviventes, houve um novo ataque e mais mortes aconteceram entre os moradores do Caldeirão de Santa Cruz. Em 1938, José Lourenço e alguns sobreviventes do segundo ataque pediram à justiça do Brasil a autorização para retornar à antiga fazenda e foram permitidos.

Volta ao Caldeirão de Santa Cruz e pedido de ressarcimento de bens

Com a volta de José Lourenço, também veio uma ação contra o governo do estado do Ceará. O beato queria o ressarcimento de todos os bens da fazenda para que pudesse recomeçar a sua vida junto com os poucos romeiros sobreviventes. Por ter sido uma ação militar do governo, claro que o pedido foi negado, mas autorizou-se o leilão do Caldeirão de Santa Cruz e o dinheiro foi entregue a José Lourenço.
Sobreviventes do massacre
Sobreviventes do massacre não tiveram auxilio nenhum. Atualmente ONGS ligadas aos direitos humanos tentam indenização para as famílias e inclusão do caso nos livros de história

Criação do Sítio União e morte de José Lourenço

O mesmo mudou-se para a cidade de Exu, em Pernambuco, onde fundou o Sítio União e ali criou uma pequena comunidade semelhante ao Caldeirão de Santa Cruz. Sem muita movimentação religiosa, José Lourenço viveu até 1946 no local, quando faleceu de peste bubônica. O seu corpo foi levado por romeiros até Juazeiro do Norte e enterrado ao lado de Padre Cícero.

A negativa do acontecimento e a busca por corpos

A ONG SOS Direitos Humanos entrou com uma ação civil pública no ano de 2008 na Justiça Federal do Ceará, contra o Governo Federal do Brasil e Governo do Estado do Ceará, requerendo que o Exército Brasileiro:
  • a) torne público o local da vala comum,
  • b) realize a exumação dos corpos,
  • c) identifique as vítimas via exames de DNA,
  • d) enterre os restos mortais de forma digna,
  • e) indenize no valor de R$ 500 mil, todos os familiares das vítimas e os remanescentes,
  • f) inclua na história oficial, à título pedagógico, a história do massacre / chacina / genocídio do Sítio da Santa Cruz do Deserto, ou Sítio Caldeirão.
Além disso ela também denunciou o Brasil à OEA (Organização dos Estados Americanos) devido aos crimes cometidos e desaparecimento dos corpos. Se você quiser saber mais sobre o caso o documentarista Rosemberg Cariry fez um relato do Massacre do Caldeirão de Santa Cruz em 1985 e você pode ver o filme a fim de conhecer mais sobre a história.(Pura ciência.com)